Crime e castigo – Dostoievski
Sempre quis ser perturbado (adjectivo, não particípio passado). Ou isso ou ter dupla personalidade (a perturbação psicológica, não o blog). Ou uma doença degenerativa qualquer. Do sistema nervoso central. Que meta movimentos involuntários das mãos ou só dum dedo, como aquele gajo daquele episódio do Hitchcock que ninguém se lembra porque só se lembram daquele do morto e do oculista e do caixão. De preferência uma que um gajo não se cague muito. Escrevi isto e agora não sei como continuar. Estou há semanas sem imaginação. Até as anotações no telemóvel (Eu: “meu, como se chama aquela banda que tem o nome parecido aos New York Dolls”? Ele: “Blondie?”) Acho que me anda a fazer mal sentir-me mais ou menos bem. É um perigo quando um gajo se mete a cantar o riff do “Riverboat song”. Corre-se o risco de se começar a dizer disparates e falar de felicidade e, quem sabe, até de amor e filhos. É como quando, ao almoço, alguém disse que a televisão tinha grão e eu achei que devia arranjar-lhe um date com o meu bacalhau com todos por terem tanto em comum. “Até podiam ir passar férias ao Luxemburgo”. O Luxemburgo é um grão-ducado e ninguém percebeu e fez-se mais um daqueles silêncios que só acabam com o Carlos, o dos Recursos Humanos, a dizer qualquer coisa acabada, invariavelmente, em “caralhos ma fodam”. E depois começam-se a ouvir coisas nos corredores. Diz que “aquele é o que diz cenas esquisitas ao almoço”, “parece que no outro dia pediu iscas” e “já o vi falar com a máquina da água e diz que ele tem um caso com a Fátima. Qual Fátima? A da contabilidade? Sim. Essa. Parece que deixa o filho sozinho em casa algemado ao móvel da despensa e quando voltam fazem o amor em frente dele. Mas ele não está numa cadeira de rodas? Está. Então não bastava desligar-lhe a bateria? Assim ao menos ninguém poderia queixar-se à Abraço. Isso não é dos animais? Não sei. Ou é dos animais, ou dos deficientes ou aquilo da SIDA. Da gorda que já não é gorda? Qual? A Margarida Marante? Essa diz que levava na cara do José Eduardo Moniz e que ficou disforme por causa da depressão e de levar nos cornos. Agora está com um olho maior que o outro e parece aquele marinheiro dos Simpsons”. Nada disto é verdade, mas as aparências iludem. Era como o Domingos. O Domingos era sempre o primeiro a ser escolhido para a equipa de futebol. Foi delegado de turma uma vez mas depois, diz que começou a ter problemas em casa, já não era tão bom delegado de turma como antes e vai daí as pessoas chatearam-se e foram dizer à “stôra” que ele já não era tão bom. E falámos nisso quando ela disse ao Domingos para “ir ver se lá na papelaria havia fita-cola daquela com cola dos dois lados” para podermos falar todos. Na altura, só mandando vir dos Estados Unidos. Ela sabia e o Domingos também e ela sabia que o Domingos sabia e o Domingos sabia que ela sabia que o Domingos sabia. Felizmente, o Domingos não se tratava na terceira pessoa, como o Júlio César e o Jardel. O Domingos tinha amigos dos computadores. E diz que o pai dele tinha uma loja de cassetes de jogos do Spectrum. O Domingos foi o primeiro a ter o Paradise Café. E eu, que comprava revistas de computadores, emprestei uma vez ao Domingos e recebi um “és um tipo fixe”. Isto para quem sempre teve a estabilidade emocional da D. Maria I, vale mais que acabar uma caderneta. Aquela dos jogos de computador e das pastilhas que quando se acabava recebia-se um computador à escolha. Isto tudo porque as aparências iludiam e o Domingos “não jogava nada, só tinha era pastilho”, diziam os das outras turmas a ver se ganhavam no jogo psicológico. As minhas turmas nunca tinham quem realmente jogasse bem à bola. Mas tínhamos classe e éramos os melhores a fazer caralhadas. O Chinês fazia passes para a baliza, o Seiça, a dois metros da baliza, rematava por cima, o Royal tinha o pé chato, o Careca era um teórico e o Domingos só tinha era pastilho. A única vez que ganhámos, marcámos o segundo golo em cima do segundo toque e depois eles diziam que já não contava e nós dizíamos que sim e depois começámos a fazer caralhadas com os dedos e, naquela altura, quem fizesse mais e melhores caralhadas e com mais convicção, acabava por ganhar. Só que a minha professora de matemática viu e pensei que ia contar à minha mãe como da vez em que toquei nas mamas da Cristina, que tinha mau hálito e acho que gostava de mim, sem querer mas pareceu mesmo de propósito. O problema das gajas que não são muito giras quando são miúdas é que depois fica o estigma. “A Cristina? Aquela que tinha mau hálito?”. Eu sempre pensei que as mulheres mudavam. Antes queriam os tipos que jogavam bem à bola e agora querem os tipos jogam bem à bola. Nas séries de televisão, o tipo que lê até consegue assim umas miúdas de vez em quando. E é por isso que leio. Mantenho a esperança que ainda há miúdas que gostam de tipos que lêem. Onde andam? “Still a total mystery”. A cena de ler o “Crime e castigo” foi armanço. Admito. Ainda acredito que, na linha verde, hei-de ter uma russa gigante à minha frente que me há-de dizer “Dostoievski?” e eu “gustarmuite” (falar russo é só trocar as tónicas com as átonas (eu, por mim, troquei o gin pelo whisky) – parêntesis dentro de parêntesis não é para todos e pode ser incesto, por mais afastados que estejam) e ela “Hell, I like you, you can come over to my house and fuck my sister!”. E depois a irmã dela é muita boa e muito calada. E sabe cozinhar e gosta genuinamente de limpar e aspirar e de ter o jantar pronto quando um gajo chega a casa e de cortar as unhas dos pés quando um gajo pede e não se importa de ficar com os filhos quando um gajo vai sair porque, na Rússia, é assim e aquilo ficou-lhes nos genes. Já o Hitler dizia que os russos eram uma raça inferior. Mas um gajo de bigode pode dizer as maiores barbaridades porque um gajo vai e desculpa. Afinal pode não ter um espelho em casa ou ser do Benfica.
De todas as maneiras que vi Dostoievski escrito, optei por esta por nenhuma razão em especial. É mais fácil por não ter acentos nem ww e yy. E um gajo vai e diz de cabeça e devagarinho e sabe sempre como se escreve. É como Nietzsche. Posso afirmar, com alguma certeza, que devo ser das poucas pessoas em Portugal que sabe escrever Nietzsche. Tirando o Pacheco Pereira. Mas esse sabe tudo e lê 30 livros por mês. Eu reduzo-me a dois. Bem espremidos entre o cheiro a suor da linha verde e o ar condicionado do 714. Já tinha gostado de “O jogador”, que li para me armar para uma miúda que eu tenho quase a certeza que me queria mas não tive coragem de lhe dizer e depois ela era muito do amor e eu, na altura, queria era foder e pensei que o melhor era não estragar aquele coraçãozinho, e achei que estava na hora. Tentei lê-lo na praia, quase há 10 anos. Lembro-me de o Raskolnikoff passar a ponde de K... e pouco mais. 500 páginas de “cenas à Dostoievski” é muita fruta, até para quem está de férias. Já tentei tudo na linha verde. Saramago, Lobo Antunes, Nabokov, Conrad, William Golding. E só uma pila no ombro e um rabo na cara. Prometo que se até ao fim do livro (faltam 80 páginas) não tiver uma russa aos meus pés, ou desisto de ler ou cometo uma loucura: “O conde de Monte Cristo”.
Crime e castigo - :D
:O~ <- livros do Nuno Markl ou do careca da bóina
:O <- livros em que um gajo fica a saber que o Pinto da Costa se peida com molho
:| <- livros em que um gajo fica a saber que o Pinto da Costa se peida
:) <- livros que também ficam bem na prateleira
:D <- António Lobo Antunes
:D~ <- livros de cheques
quarta-feira, 8 de agosto de 2007
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7 comentários:
o dostoievski não resulta. também já tentei com "o idiota" (não a melhor escolha, admito...) mas ninguém meteu conversa comigo no tube para ir afiambrar a irmã boa e calada. e cometer uma loucura era ler o "guerra e paz"...
Tchhh...
e eu que não conhecia este sistema classificativo? [Afinal ainda posso ser feliz [ignorantia mater felicitas), ainda há esperança!).
A do Lobo Antunes (o António, não o João) é Fantástica.
Nuncameide esquecer d'As Naus.
Sópraconcordar qu'isto (quisto é outra cena) dos parêntesis não é para todos.
Mas até aposto que a maior parte não topou a cena de trocar os rectos [hum... ora aí está uma ideia (escatológica) estranha] com os curvos.
For what it's worth:
- Existem muitas miúdas que preferem gajos que lêem a jogadores da bola. Pessoalmente nunca gostei de jogadores da bola, tinham sempre a puta da mania e preferiam sempre as gajas que já na 4ª classe tinham as mamas grandes;
- "O Conde Monte Cristo" não é tão mau como as pessoas querem fazer parecer. A sério. Eu já li e gostei. Claro que na altura ainda não tinha visto o filme protagonizado por aquele gajo que fez de Jesus n' "A Paixão de Cristo" e cujo nome não me vem agora á memória por isso o final até que foi interessante.
""O Conde Monte Cristo" não é tão mau como as pessoas querem fazer parecer."
É pá, o Conde de Monte Cristo é uma obra prima. Lindo, excelente, do género:
:D~
P.S. O filme era uma bela merda btw
quem lê o conde de montecristo quando existe uma telenovela chamada "vingança"?
Provavelmente quem leu o Conde Monte Cristo quando ainda não tinha passado pela cabeça de nenhum argumentista dar cabo de uma obra prima literária. Ou então, sei lá...pessoas que até gostam de ler, just a wild guess.
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