domingo, 23 de dezembro de 2007

novus magnificat

Apaguei o cigarro no cinzeiro de mármore em cima da secretária e esperei que falasse. “Sam” - disse ela - “ouvi dizer que és o melhor no negócio”. Não me chamava Sam mas ela era demasiado boa para me chamar o que quisesse. “Sabes, Jess” - disse eu - “um homem tem o seu preço”. Ela não se chamava Jessica mas eu também não fumava. “Oh Sam, essa frase não tem nada a ver” - respondeu ela, escondendo a cara no lenço branco. Levantei-me em direcção à porta, que lhe abri, e disse que ia pensar no caso. Pensava sempre no caso.
Acontecia sempre assim. Uma mulher abandonada, um marido enganado. E sobrava sempre para mim. Encostei-me para trás e acendi outro cigarro que não fumei, até porque não podia fumar no local de trabalho. Deixei-o apenas a queimar no cinzeiro porque os gabinetes dos detectives da televisão têm sempre fumo. Abri o jornal e ainda se falava do meu último caso. O Dr. Mitchell. Assassinado na sua mansão na rua 13. Eu disse logo: “foi o mordomo”. Alguém me perguntou como sabia. “A culpa é sempre do mordomo” - respondi eu. Além disso era o único com a camisa cheia de sangue e a faca de carne ainda na mão. Estava apaixonado pela governanta e a única coisa que os separava era a fortuna do Dr. Mitchell.
O telefone tocou de seguida. Tinha acontecido. Peguei na gabardine e no chapéu cor de nódoa. O táxi já me esperava, como se soubesse. Não é bem assim. Fui eu que o pus lá, para encurtar o parágrafo. “É para o cruzamento da 36 com a 9, Tony” - disse eu. Ele não se chamava Tony, mas eu estava demasiado bem vestido e podia-lhe chamar o que quisesse, até Pedro, o mexicano. Respondeu: “Certo, amigo. Mas quer ir pelos túneis ou vamos ali pelo Campo Pequeno?”. Não lhe respondi porque no parágrafo a seguir já lá cheguei.
O carro do tenente já lá estava. Como se soubesse. Como se soubesse sempre. Eles tentaram tirar-me tudo. Mas aqui com o velho Joe ninguém brinca. Na sala um corpo pendurado do tecto por uma corda à volta do pescoço dizia suicídio. Dizia mesmo. Por isso alguém teve de a calar. “Que acha que aconteceu, Bob?” - perguntaram-me. Não me chamava Bob mas apostei em suicídio por enforcamento. Até porque era o que dizia na nota deixada em cima da mesa de café, dizia mesmo. Até a escrevaninha quis dizer qualquer coisa mas calámo-la com um machado. Amanhã seria notícia de novo. “Detective resolve novo caso”. Teria direito a fotografia e até entrevista.
Quando voltei ao gabinete já ela lá estava. Tinha-o feito e eu sabia-o. Correu para mim a chorar e disse “oh, Sam”. Agarrei-a e deixei que chorasse no meu impermeável, mandá-lo-ia limpar a seco, se necessário. Depois não tive alternativa se não meter-lhe as algemas. Aproveitei que estava de algemas e comi-a por trás como ela gostava. No fim, vim-me nas costas dela e barrei-a com a faca da manteiga. Deixei secar até fazer crosta e chamei a polícia. Espero que apodreça na prisão.

8 comentários:

Anónimo disse...

fodasse, 'es um senhor!

eu com a tua labia, o meu charme e o meu corpo comia as gajas todas que quisesse..

tiagugrilu disse...

Detesto dizer isto, mas: Está Genial.

Anónimo disse...

brilhante

Anónimo disse...

andas a ler muito boris vian.

Anónimo disse...

mt a frente!!

ambrozote disse...

este blog está cada vez melhor. a escrita refina a olhos vistos. e eu só gosto de ler posts curtos...
parabéns. está....DO CARALHO!

Anónimo disse...

LOL
(Mas os meus comentários não conseguem ser mais elaborados que isto??)
Grand Finalle!

El-Gee disse...

gostei deste. ja li uns 50 posts de 2008 e ri'me imenso com alguns, tendo achado outros uma verdadeira javardice, que, tendo tambem piada, me repugna um bocado.


mas este post, sim, esta mt bom.